24 de janeiro de 2020

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Por: Apelmat

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Categorias: Legislação

A REPRESENTAÇÃO SINDICAL E SEU CUSTEIO

I – O SISTEMA SINDICAL BRASILEIRO “´É, MAS NÃO É”

O sistema sindical brasileiro tem como princípio a representação vinculante por categoria, seja profissional ou econômica. A Constituição de 88 introduziu algumas liberalidades mas manteve o caráter essencialmente corporativo do sistema.

O grande salto para o liberalismo se deu com declaração de que é livre a organização sindical da mesma forma que o direito de associação, somados à não interferência e intervenção do Poder Público na organização sindical. No entanto, não basta somente declarar. Assim é que os arroubos liberais perdem fôlego logo em seguida, com a ressalva do registro no órgão competente, mantendo o viés cartorário. É, mas não é.

Caminham juntos, portanto, mas nem sempre de mãos dadas, princípios liberalizantes com outros de cunho corporativista como a unicidade sindical; a representação vinculante; as receitas para exercício da representação e a cereja do bolo, a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.

II – NEGOCIAÇÕES COLETIVAS PARTICIPAÇÃO OBRIGATÓRIA DOS SINDICATOS

Já podemos a esta altura fazer algumas afirmações sem receio de errar muito.

Primeira: O sistema sindical brasileiro baseia-se na representação vinculante. Fato.

Isso implica em dizer que, se por um lado o ato de se associar a sindicato é livre, respeitando-se a manifestação de vontade, seja de empresa ou de empregado, por outro não há escolha possível quanto à representação. Ela está vinculada à atividade econômica ou à profissão desenvolvidas. Ponto. Ser contra ou a favor desse sistema não é o objeto deste ensaio. Isso demandaria outra abordagem, bem mais elaborada. O que fizemos até agora foram constatações, nada mais. É o que está escrito e não demanda interpretações. Gostar ou não; concordar ou discordar dessa sistemática é indiferente e nada vai acrescentar à esta abordagem.

Segunda: Paralelamente à representação vinculante temos a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho. Isto também não demanda interpretações. É princípio constitucional imperativo. Aplica-se tanto às representações laborais quanto às patronais, exceção feita às empresas inorganizadas em sindicato que podem celebrar acordos coletivos de trabalho com os sindicatos profissionais sem a participação da respectiva representação (art. 618 da CLT).

O fato é que, se a Carta de 88 se mostrou inovadora, foi no sentido de propiciar que a estrutura sindical se desprendesse do Estado. No mais, manteve os preceitos corporativistas do modelo anterior.

A partir da vigência da Lei nº 13.467/17, também chamada de “Reforma Trabalhista”, várias alterações foram promovidas nas legislações laboral e sindical. No âmbito das negociações coletivas, as novas disposições procuraram privilegiar o negociado sobre o legislado. De fato, o que a nova lei objetivou assegurar foi o respeito, pelo Judiciário, às condições negociadas. Nada mais. Isso, com efeito, não havia antes, prevalecendo o poder normativo da Justiça do Trabalho. Se haverá agora, somente o tempo vai dizer. Quanto à participação no processo negocial, esta continua sendo prerrogativa dos sindicatos, não extensivas às associações civis.

Dentre as alterações promovidas, uma, pelo menos, foi substancial o bastante para virar de ponta cabeça os princípios anteriores. Assim, a nova disposição do art. 620 da CLT, estabelece que as condições fixadas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva. A redação anterior desse dispositivo dizia exatamente o contrário. É uma mudança e tanto se tivermos em mente a distinção entre os conceitos de convenção e acordo coletivo, mesmo considerando que, pela lei, somente as empresas inorganizadas em sindicato podem celebrar acordo coletivo.

Sabe-se, no entanto, que muitos acordos coletivos são concluídos com as empresas, inorganizadas ou não, sendo inclusive levados a registro, sem a assistência do respectivo sindicato. Isto Artigo é, no entanto, ilegal.

Significa que as representações patronais precisam, cada vez mais, assegurar sua participação nos processos negociais envolvendo suas representadas, o que se dá através do estabelecimento de cláusulas convencionais específicas nesse sentido.

III – FONTES DE CUSTEIO MANUTENÇÃO DO SISTEMA

Em março de 2018, em decisão proferida nos autos do ARE 1.018.459, com efeitos de repercussão geral, o STF considerou inconstitucional a cobrança da contribuição assistencial de empregados não sindicalizados, seja por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa.

Anteriormente, a Súmula Vinculante 40, também do STF, havia estabelecido que a contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da CF, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.

Ora, nesse diapasão restou apenas a contribuição sindical. Não por muito tempo, entretanto, uma vez que a Lei nº 13.467/17, em vigor a partir de 11 de novembro passado, alterou o art. 578 e seguintes da CLT, tornando voluntária essa contribuição, na medida em que passou a exigir autorização prévia e expressa para sua cobrança.

Partindo-se do que foi dito nos dois tópicos anteriores podemos concluir que se o sistema sindical é de representação vinculante por categoria, levando-se em conta as diversas atividades, e ainda o fato da participação nas negociações ser obrigatória, há que se ter uma fonte de receita também compulsória para financiá-lo, assim como a participação nas negociações coletivas. Não há como fugir disso, salvo emendando a Constituição. Ou violando-a. Com efeito, entidades sindicais não são instituições beneficentes, que vivem de doações, nem associações civis, que dependem da contribuição de seus associados. Se o ato de se associar a sindicato é uma manifestação voluntária, como já vimos que é, não o é a representação. Esta não implica em escolha, eis que vinculante. Dessa forma a conta não fecha.

Resta, portanto, às entidades sindicais encontrar fontes alternativas para suprir tal receita, objetivando o cumprimento de seu papel constitucional.

No atual cenário, vislumbramos duas alternativas. A primeira, que chamaremos de RECEITA DE REPRESENTAÇÃO SINDICAL PATRONAL, tem como fundamento o sistema de representação vinculante por categoria, tendo por respaldo legal o disposto no art. 8º, inciso IV, e art. 149, ambos da CF, e na alínea "e", do art. 513, da CLT. Ambos os dispositivos tratam de contribuições compulsórias, devidamente aprovadas em assembleia e constantes de norma coletiva, sendo extensivas a toda a categoria representada, eis que toda ela se beneficia de suas disposições, que têm aplicação erga omnes, ou seja para todos os representados. Refere-se, portanto à toda a categoria.

A outra, consiste da contribuição associativa ou decorrente da filiação ao sindicato, sendo devida apenas por quem for associado ou filiado, assim entendido aqueles que aderem por livre manifestação da vontade aos quadros da entidade.

As empresas associadas ao sindicato poderiam, eventualmente, ser dispensadas do pagamento da RECEITA DE REPRESENTAÇÃO, se assim determinarem os estatutos das entidades.

CONCLUSÃO

Dessa breve abordagem conclui-se que as entidades sindicais continuam desempenhando papel fundamental nas relações de trabalho. Sem sindicato não há negociação possível. Não obstante, como se viu, há que se custear tal prestação de serviços. Nesse sentido, o Ministério Público do Trabalho, bem como o próprio Judiciário Trabalhista, vêm buscando encontrar soluções para o problema de forma a conciliar a representação vinculante com os princípios liberais consagrados pela Constituição. Muito se fala em soberania da assembleia sindical ou mesmo a volta do direito e oposição, no caso das entidades laborais. Não é missão fácil, entretanto, uma vez que tais princípios, por si, são excludentes. Isso importaria, como já vimos, emenda à Constituição, o que não se vislumbra no momento. Enquanto isso, garantir a sobrevivência das entidades e seu papel constitucional é fundamental.

Fernando Marçal Monteiro Advogado, assessor jurídico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo – FECOMERCIO SP. Atua nas áreas sindical, trabalhista e previdenciária

Postado em 17/12/2018