Vendas de cimento crescem em maio, mas não garantem fôlego à essa indústria
As vendas de cimento no Brasil cresceram 6,5% em maio na comparação com o mesmo mês do ano passado, somando 5,7 milhões de toneladas. O desempenho marca uma recuperação em relação ao recuo de abril (-3%). De janeiro a maio, o crescimento acumulado é de 4,6%, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC).
Com os dias úteis considerados, o volume vendido em maio foi de 244,1 mil toneladas diárias, avanço de 3,1% sobre abril e de 4,2% ante o mesmo mês de 2024. No acumulado do ano, a alta é de 6,0%.
Boa parte dessa performance, segundo o SNIC, deve-se à base reprimida no mesmo período do ano anterior. Em 2024, o mês de maio foi especialmente impactado pelo desastre climático no Rio Grande do Sul, que afetou obras e cadeias logísticas. A recuperação em 2025, portanto, embute um efeito estatístico que infla os números.
Habitações promovem crescimento nas vendas de cimento em maio
Entre os fatores que sustentam a demanda pelo insumo está o desempenho do mercado de trabalho. Com taxa de desemprego de 6,6% até abril — a menor para o período desde o início da série histórica, em 2012 —, a formalização do emprego avança, e há mais profissionais com carteira assinada. Esse ambiente favorece o consumo, inclusive de materiais de construção.
Além disso, as obras habitacionais seguem em expansão, principalmente em razão do relançamento do Minha Casa, Minha Vida (MCMV), que hoje representa 53% de todos os lançamentos imobiliários registrados no primeiro trimestre. O programa tem contribuído para manter o setor ativo, especialmente no segmento de baixa renda.
Confiança sobe, mas construção perde fôlego
Indicadores de sentimento mostram sinais mistos. O Índice de Confiança do Consumidor da FGV subiu em maio, tanto na percepção atual quanto nas expectativas. A indústria também registrou a maior alta do ano no índice da fundação. Ainda assim, chama atenção o aumento dos estoques pelo segundo mês seguido, o que indica uma possível desaceleração na ponta da demanda.
Já na construção civil, o clima é mais cauteloso. A confiança do setor recuou novamente e atingiu o menor patamar desde junho de 2021. A escassez de crédito e o encarecimento do financiamento vêm prejudicando sobretudo as incorporadoras de médio padrão, que enfrentam dificuldade para honrar compromissos financeiros.
De janeiro a abril, os recursos da poupança destinados pelos bancos ao financiamento da construção recuaram 48,6% em relação ao mesmo período de 2024, o que ajuda a explicar o enfraquecimento dos canteiros de obra em segmentos fora do MCMV.
“O financiamento imobiliário apresentou uma forte queda de 70,4% de unidades no acumulado até abril de 2025, já refletindo a alta da Selic. A majoração da taxa básica de juros amplia a concorrência dos ativos financeiros frente aos ativos imobiliários. Ou seja, o investidor que aplicaria recursos em imóveis passa a destiná-lo para outras frentes financeiras, o que é extremamente preocupante para o mercado da construção civil e vendas de cimento”, diz Paulo Camillo Penna, presidente do SNIC
Perspectivas limitadas para vendas de cimento após maio
A expectativa do SNIC é de que os próximos meses apresentem crescimento mais modesto nas vendas de cimento. A política monetária classificada pelo sindicato como contracionista, somada aos sinais de desaceleração da economia e aos cortes no orçamento do governo federal, deve manter o setor em compasso de cautela.
Para o SNIC, mesmo com gargalos evidentes na infraestrutura e o déficit habitacional persistente, a combinação de juros elevados e crédito escasso limita a expansão mais ampla da atividade. O ambiente fiscal pressionado também freia os investimentos públicos em obras de grande porte, reduzindo um dos principais motores de tração da indústria do cimento.
Transição energética e redução de emissões ganham protagonismo
Diante do cenário macroeconômico, a indústria brasileira do cimento deve seguir investindo na agenda de descarbonização e inovação tecnológica. Um dos focos é a substituição do coque de petróleo, principal insumo energético do setor, por combustíveis alternativos como resíduos industriais e biomassas.
Em 2023, o setor atingiu a maior marca histórica de coprocessamento, com 3,25 milhões de toneladas de resíduos utilizados nos fornos de cimento — o equivalente à antecipação de uma meta estabelecida para três anos à frente. Essa tecnologia evitou a emissão de cerca de 3,4 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂) em comparação aos métodos tradicionais.
A busca por soluções de baixo carbono tem levado a indústria a reforçar compromissos com metas climáticas, alinhadas ao Plano Clima. Nesse contexto, o SNIC e a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) promovem, entre os dias 30 de junho e 2 de julho, o 9º Congresso Brasileiro do Cimento e a primeira edição da Expocimento, no WTC Hall, em São Paulo.
O evento reunirá representantes do governo, da indústria e especialistas para debater os rumos da transição energética no setor. A expectativa é que temas como inovação, circularidade, regulação ambiental e competitividade estejam no centro das discussões.
Infraestrutura e moradia como vetores de recuperação
Mesmo com a pressão de custos e o enfraquecimento do crédito, a indústria mantém expectativa de recuperação estrutural puxada por investimentos em infraestrutura e habitação. As concessões rodoviárias, por exemplo, seguem demandando grandes volumes de cimento para execução de obras e manutenção de ativos, especialmente em corredores logísticos estratégicos.
Além disso, o déficit habitacional no Brasil — estimado em cerca de 6 milhões de moradias — continua sendo um vetor de demanda importante, sobretudo em momentos de maior coordenação entre políticas públicas e financiamento.